Helena Poças Leitão
A primeira
definição de política vem do grego politiké
= ciência dos negócios do Estado. A política surgiu na antiga Grécia,
com Platão. Ele percebeu que através da educação cada homem desenvolve suas
ideias e passa a viver de acordo com elas. O despertar para o mundo das ideias
é um processo lento e gradual. Aliás, uma das características que diferencia o
ser humano dos outros animais é sua capacidade de pensar, refletir, criar
coisas novas com base em outras experiências ou experiências passadas. Foi ele também
o primeiro a se preocupar com questões políticas, com formas de governar a
pólis (cidade-Estado grega). Na pólis vive o cidadão, ou seja aquele que vive
na cidade-Estado, assim a ideia de cidadania é bastante antiga.
Mas foi com Aristóteles que nasceu a política com forma sistemática, como necessidade natural do homem. O homem busca a felicidade, que é o maior de todos os bens, mas o homem não vive só, isolado, ele vive em grupo e precisa dos outros. Portanto, a felicidade coletiva, a ciência, a ética, e a política são os maiores bens do ser humano. Para Aristóteles a ciência política deveria ser extremamente ética.
Mas foi com Aristóteles que nasceu a política com forma sistemática, como necessidade natural do homem. O homem busca a felicidade, que é o maior de todos os bens, mas o homem não vive só, isolado, ele vive em grupo e precisa dos outros. Portanto, a felicidade coletiva, a ciência, a ética, e a política são os maiores bens do ser humano. Para Aristóteles a ciência política deveria ser extremamente ética.
Mas como a
política é tratada no Brasil? Como mostrar a importância da política para os
alunos? A professora e historiadora Bruna Cantele debate sobre o tema e explica
a influência da política na educação brasileira.
RCEG: Como trabalhar o tema “política” em sala de
aula para alunos do Ensino Fundamental I?
Bruna Renata Cantele: Do
mesmo modo como adultos discutem e questionam os problemas, grupos de crianças
que possuem pensar coletivo em muitos assuntos discutem e tomam decisões e
partidos. Política deve ser assunto de sala de aula. O que não podemos fazer,
com certeza, é expressar preferência por um ou outro partido político, isto é,
partidarizar as aulas e nem tão pouco sair em defesa de algum político, afinal
nós somos os multiplicadores de diferentes saberes. A vontade de cada um deve ser
respeitada. Temos obrigação de formar cidadãos
pensantes. Há muita coisa para se fazer, como o canto do Hino Nacional, símbolo pátrio auditivo, (que poucos adultos sabem cantar) o hasteamento da bandeira, o estudo de um símbolo do Estado ou da Pátria e, assim, está pronto o momento de cidadania, e o momento político de diferentes socializações de saberes.
Os alunos
podem, dessa forma, viver experiências de
atividades como poder escolher o seu
representante de classe; estabelecer algumas regras para seus trabalhos;
assumir responsabilidades nos trabalhos
individuais, de grupo, adquirir liberdade,
autonomia e respeitar os direitos dos outros. Os alunos começam a desenvolver uma consciência crítica, um
comportamento cívico e a possibilidade
de se tornarem futuros cidadãos, mais politizados para avaliar, escolher os líderes da sua comunidade, do seu estado, do seu país.
Para
Vigotsky as crianças são capazes de trabalhar com ideias muito mais do que as
pessoas imaginam.
RCEG: A Profa. acredita que a falta de conhecimento
político do povo brasileiro deve se à pouca abordagem do tema desde a infância?
BRC: Sim, a pouca abordagem ministrada
nos cursos não desperta nas crianças o desejo de conhecer quem são os
políticos, o que eles representam na vida da comunidade; onde e como eles
trabalham, como são eleitos. Acredito que o desenrolar de uma conversa em sala
de aula poderá ser um mote para que as crianças ganhem a criticidade política.
Verifica-se que não obstante os bonitos discursos circunstanciados
politicamente, a educação formal continua sendo compartimentada em componentes,
em grande quantidade voltada a conteúdos informativos, ministrada através de
aulas expositivas e centradas em manuais escolares. O desejado desenvolvimento
escolar, fundamentado em bases de política, da concepção global/integral das crianças
e dos jovens, nas suas múltiplas dimensões, cognitivas, étnicas e humanísticas,
não está acontecendo como devia.
A profissão
do professor é paradoxal. De todas as ocupações, somente o ensino é responsável
e encarregado da dificílima tarefa de habilidades e capacidades humanas que permitam
às sociedades terem êxito. Mas é a escola que precisa se reestruturar politicamente,
e tudo começa com a educação, com a formação dos professores, com projetos para
acompanhar essa sociedade brasileira em transformação. Que a globalização e a
transmissão do conhecimento sejam compartilhadas por muitas instituições, e que
o trabalho não seja individual, mas grupal.
O sistema
educativo, para mim, seria o conjunto de regras e tudo o que acontece dentro e
fora da escola. Assim, participa do sistema muito mais a comunidade, na qual as
associações, os meios de comunicação e a internet têm fundamental importância.
Eu diria que a instituição educativa não pode trabalhar isolada. A falta de
conhecimento político desde a infância leva o jovem à carência de bons saberes
sobre o tema. Poderíamos pensar em um trabalho mais sistemático de apresentação
dos direitos e deveres dos cidadãos para os jovens em suas primeiras incursões pelo
universo educacional (como o direito do consumidor, leis de trânsito, direitos
das crianças e adolescentes, direitos humanos). Obviamente que tudo isso
deveria ser adaptado e que os professores deveriam ser preparados para que esse
estudo venha a ter a eficácia desejada.
O futuro
tende a descentralizar, dar maior autonomia aos docentes e às comunidades em razão
de um fato importante que antes não existia – o contexto. Antes tudo era igual,
hoje, ao contrário, tudo está mais contextualizado, porque aí estão todos os
problemas da sociedade. O futuro será descentralizador.
RCEG: Os professores estão preparados para trabalhar
a política em sala de aula?
BRC: Acho que há muito para se fazer
ainda; mas muito já foi feito com os professores. É preciso seguir uma série de
etapas, estamos no século XXI, um tempo de transformações velozes, de
complexidade crescente, de novas linguagens tomando conta da sociedade, de
novos saberes. Contudo, o espaço escolar não é mais o único lugar para se
aprender, por isso nosso desafio deve ser constante, devemos nos atualizar. Mas
onde adquirir os conhecimentos políticos para essa dinâmica se não há ênfase política
nos cursos de pedagogia? Na verdade os professores se preocupam
mais
com a alfabetização do que com a política. Lembremos que são os primeiros professores
os catalisadores da sociedade de informação. Eles deveriam estar mais bem
preparados, o Estado devia fornecer subsídios para isso. Os professores passam
por imensos desafios e aqueles que desejam reformar o ensino e aperfeiçoar
saberes sofrem a solidão desse processo. Recebemos legados culturais muito
menores que outros países.
RCEG: Quais os benefícios, para os alunos, de
aprender conceitos básicos da política desde cedo?
BRC: É importante que a política venha
a ser parte do currículo de jovens, para que eles cresçam sabendo de suas responsabilidades,
de seus direitos, para que participem de forma mais ativa na construção do
nosso país. Acredito que os jovens mais politizados, conscientes, escolhem melhor
por meio do voto seus representantes. Os jovens estudantes certamente não vão
acabar com a desigualdade social, mas terão um melhor
treinamento de habilidades essenciais para que
se cumpra o processo democrático.
Os
jovens de hoje serão os representantes do povo amanhã, não podemos nos esquecer
disso. Quando enfrentarem conflitos e discordâncias, farão desses momentos
debates para o processo democrático, o uso da cidadania e da política. Esperamos
que eles se tornem agentes qualificados do processo de mudança, reagindo rápida
e eficazmente às mudanças sociais e políticas, e que entrem em contato com a
realidade política do país em que vivem.
Sugiro
aos professores que incentivem a dialética sobre o prefeito, o governador e o presidente
do país em que vivem, usando temas como: se eu fosse prefeito de minha cidade,
ou o governador de meu estado, ou ainda o presidente de meu país, o que eu faria?
O trabalho poderá ser individual ou em grupo, escrito ou também ser colocado em
um mural, sendo exposto para socializar as ideias.
RCEG: Os brasileiros não acreditam na política devido
aos escândalos, desvios de dinheiro pelo governo, pessoas despreparadas que se
candidatam a cargos públicos, entre outros. Como a professora acha que podemos
mudar esse quadro?
BRC: Sem generalizar, vamos pensar juntas?
Somos catalisadores da mudança na sociedade, somos vítimas do enfraquecimento
da rede de redução dos gastos com o bem público, da convulsão social na família
dos aluno, e boa parte do descompromisso com a vida pública e política.
É
comum ouvir em uma reunião social as pessoas dizerem; – Ah! Falar de política
não muda o foco!
Nosso
interesse político é muito pequeno, somos pouco alfabetizados politicamente. Essa
nossa ausência de participação política gera o desconhecimento que passa de geração
para geração. Acredito que os escândalos e os desvios de dinheiro pelo governo
feitos pelos candidatos a cargos públicos não acontecem só no nosso país. Mas no
Brasil temos tido governos que se afastaram dos planos propostos e fizeram dívidas
nacionais para liberar o investimento pessoal. E é neste que surge a escola pública
como um dos itens mais onerosos e vulneráveis na lista dos gastos públicos. Estamos
despertando politicamente; viemos de escândalos desde a Primeira República, escândalos
no Governo Vargas (ditadura varguista, o peleguismo); depois, veio o período da
República populista de 1951-1964 e uma ditadura de mais de 20 anos (1964-1985),
nosso conhecimento é relativamente pequeno no que diz respeito à democracia, ao
processo eleitoral etc. Atualmente ouvimos falar em mensalão, imunidade
parlamentar, picaretagens e outros termos que nos envergonham como brasileiros.
Rui Barbosa faz quase cem anos, mas ele tinha razão ao
dizer: “De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer as injustiças,
de tanto ver agigantarem os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a
desanimar da virtude, a rir-se da honra e ter vergonha de ser honesto”.
RCEG: Ano após ano,
candidatos prometem investir mais em educação, porém, aparentemente não
enxergamos mudanças significativas. A professora tem a mesma opinião?
BRC: Sim, temos que promover uma educação que contrarie a
cegueira do pensamento simplificador (“deixa isso para lá, depois eu resolvo, amanhã
é outro dia, vamos em frente, deixa, o que for eleito está bom, nada vai mudar
mesmo...”) dando aos professores uma educação que desenvolva a competência de pensar
de uma forma mais global, mais humanista. Falta lançar bases sólidas, bases que
implicam o desenvolvimento do espírito ético e social. Para que se cumpra o
projeto educacional de modo significativo: regularizar o fluxo escolar, tirar o
jovem das ruas, montar programas educativos, acelerar a prática educativa para
que o aluno e o professor sejam contemplados.O aluno, com o conhecimento, e o professor
com vontade de transmitir saberes tendo um salário digno.
Acho que é necessário mudar a forma de conceber a educação.
Razões epistemológicas, pela própria evolução do modo de pensar sobre natureza
e conhecimento, vão levar às mudanças. As promessas são parte do processo político;
mas cumpri-las é que são elas... O que é uma pena, pois as concepções
políticas, como já foi dito, nascem com a realização nos primeiros anos do
Ensino Fundamental.
RCEG Como a
professor. vê a qualidade de educação oferecida nas escolas públicas e nas escolas
particulares?
BRC: A função da escola e o paradigma educativo dominante têm
que ser reequacionados, diante dos desafios colocados, com crescente premência,
nas sociedades contemporâneas, e que são decorrentes: da falência da crescente compartimentação
e da atomização do conhecimento científico; dos desastres e desequilíbrios
ecológicos; do alastramento de doenças com elevadas taxas de mortalidade; da contaminação
da cadeia alimentar; do enfraquecimento da família; do alastramento da
subcultura que se traduz na perda do sentido estético, da criatividade e do
espírito crítico; da perda de referências culturais e patrimoniais. Tudo isto colaborou
para a desigualdade entre a educação pública e a particular. A escola pública
ou particular deveria ser o centro de referência de cidadania. Já trabalhei na
rede pública e, agora, na rede particular. As minhas aulas sempre tiveram a
mesma qualidade.
Vejo a
educação como um processo de ampliação de experiências e realização de novas
aprendizagens. Se não estiver enganada 90% dos brasileiros que podem pagar escola
colocam os filhos em escolas particulares. Por quê? Porque nas últimas décadas
houve uma grande inversão de valores de políticas educacionais públicas. Falta
vontade política, recursos e, sobretudo, compromisso com o resultado dos alunos.
Isso acabou virando uma bola de neve, que afetou educadores que se desdobram
para manter a qualidade do ensino, tarefa que pode durar muitos anos ainda (20
ou 30 anos). Resultado: compromete-se o futuro dos alunos, enganam-se os professores
com falsas promessas e a maioria dos brasileirinhos não terá a prometida
educação.
O novo
modelo educativo tem que requerer sintonia maior entre o pensar e o sentir,
entre o desenvolvimento da abstração e dos diversos aspectos da personalidade. Devemos
associar num mesmo ato, em qualquer proposta educativa, o conhecimento com o afeto,
o pensamento, o raciocínio com a moralidade, o acadêmico com o pessoal, as
aprendizagens com os valores. Ou seja, escola pública
ou particular deviam compartilhar uma educação integral, uma meta eu historicamente deveriam estar presentes em todas as pedagogias inovadoras.
RCEG: A senhora tem conhecimento de projetos
bem-sucedidos criados pelo governo ou por instituições educacionais sobre o
ensino de política para crianças?
BRC: Conheço o programa Acelera Brasil,
promovido pelo Instituto Ayrton Senna, que demonstrou ser possível fazer muito
pelos jovens nos primeiros anos do Ensino Fundamental I – com paciência,
carinho e afeto. Mas ainda falta vontade política, práticas públicas e
compromissos das autoridades competentes.
Conheço
também algumas ONGs que atuam nessa área da educação promovendo reformas
ambientais, reciclagens etc.
Trabalho
em um colégio da rede particular de ensino e acabamos de realizar alguns
projetos dos quais posso disponibilizar as principais ideias. Iniciamos o
trabalho, preocupados em estruturar uma metodologia que respeitasse as
especificidades de cada trabalho dos alunos envolvidos. Traçamos uma linha de
trabalho, o que podia e o que não podia ser feito. Deixamos claras, as
situações cotidianas, os enfrentamentos que eles teriam e assim foi...
Trabalhamos o atual processo eleitoral no Fundamental com o projeto de
personagens da literatura infantil que se tornaram candidatos. Os alunos fizeram
seus projetos políticos, em torno dos temas: saúde, educação, biodiversidade. Apresentaram
os projetos às classes, fizeram os “santinhos” e distribuíram entre os colegas,
discursos animaram a campanha política, tudo de acordo com o que se vê na TV.
Distribuíram entre os colegas programas políticos.
Depois,
ocorreu o processo de votação com urnas eletrônicas cedidas pelo departamento
de informática. Claro que ganhou o partido que lutou pela biodiversidade,
assunto do momento.
Outro
projeto foi o “vereador mirim”, Parlamento Jovem, que foi a Câmara Municipal de
São Paulo e a aluna defendeu o tema: Preservação do Patrimônio Histórico. Experiência
de cidadania e contato com a realidade política e vivência com o plenário.
RCEG: Em sua opinião, o país está progredindo ou regredindo?
Por quê?
BRC: Sou otimista, não vejo
regressão no país. Mas pé no chão... o país ainda não mudou a forma de pensar e
fazer educação, muitas vezes atropelamos razão e bom senso. É preciso definir prioridades,
se não o que acontece é que a educação muda, mas não melhora.
Os
temas que tratamos são reconhecidos por todos como necessários ao bem público. Estamos
discutindo o que muitos gostariam de fazer, colocando problemas que muitos certamente
já discutiram. Estamos procurando nossa identidade como brasileiros, e quem
trabalha com educação e é educador não pode ser pessimista, tem que otimizar ideias
e continuar a lutar pela melhoria e qualidade da educação. Posso até não ser original,
mas com certeza percebi que da minha juventude até hoje só crescemos, imagine
se não existisse falcatruas, hem!!! Que maravilha seria.
Acredito
na democracia e, acima de tudo, numa forma de vida e num processo permanente de
libertação da inteligência e não em regime de governo. Para
mim democracia e ensino são inseparáveis e
influenciam se mutuamente: a educação ganha em intensidade e, quanto maior for à presença da ética democrática nela existente, mais cresce o sentido de políticas públicas e elas se tornam democráticas.
Acredito
também que nós, professores, temos a força para mudar o rumo de muitas coisas
neste país. E, para terminar, frases de Martin Luther King:
É melhor tentar e falhar que se preocupar
e ver a vida passar.
Eu prefiro na chuva caminhar que em dias
frios em casa me esconder.
Prefiro ser feliz embora louco que em conformidade
viver.
Se soubesse que o mundo se desintegraria
amanhã, ainda assim plantaria a minha macieira. O que me assusta não é a
violência de poucos, mas a omissão de muitos. Temos aprendido a voar como os
pássaros, a nadar como os peixes, mas não aprendemos a sensível arte de viver como
irmãos.